• Início
  • Contato
  • Sobre mim
  • O blog
Tecnologia do Blogger.

La Petite Souris

 


As luzes azuis piscam em ritmo ordenado/Através da janela, a chuva morna cai/Formando uma mistura inebriante de marcantes aromas/Churrasco, vento quente e chão molhado//As luzes azuis suspendem o movimento caótico/Porém, não está suspensa a agitação que coordena a casa/Por entre carregadores de celular, petit fours de aliche e barulhos de televisão;/Perfumes enjoativos se encontram no ar, uma guerra sazonal costumeira//E, de repente, as luzes azuis se apagam/A escuridão, porém, é logo cortada por uma luz única vinda do teto/Batom vermelho, cabelos por trás da orelha, correntinhas no pescoço/O clique abafado das chaves girando na fechadura//A luz amarela do corredor se acende ao suave movimento do sensor/Uma última checada para garantir que o gás está fechado/Sorrisos nervosos, saltos batendo no chão/Álcool em gel na mão depois de acionar o elevador para o sétimo andar do prédio//Pinheiro falso, renas de plástico, "cuidado para não escorregar"/Estacionamento vazio, barulhos de fogos de artifício sendo estourados ao longe/O rádio do carro sintonizando música pop anos 2000, Mariah/Uma parada antes do destino final//Um resumo da Véspera de Natal.

Share
Tweet
Pin
Share
No comentários
O meu Calendário do Advento me pediu, então aqui estou: este é o primeiro conto de Natal de 2022 que vocês lerão aqui no blog. Eu desejo de coração que vocês gostem... E, também, que me indiquem novos temas para as outras histórias que aqui se escreverão. Um bom início de dezembro para vocês, querido(a)s amis! :) ------------------------------------------- Era a primeira noite com neve do ano. Pela janela, podia ver o asfalto sendo coberto por uma grossa manta alva, o contraste com o grafite surrado remetia a sabão e roupa suja. Pequenos flocos de neve caíam do céu arroxeado e tudo se esfriava, respirações congelavam, sorrisos de crianças apareciam encantadas com a certeza de que o Natal finalmente havia chegado. Elas teriam sido boas ao longo do ano? Ganhariam doces multicoloridos ou pedaços de carvão nas meias penduradas no alto da lareira? Inspirada por suas alegrias inocentes, não tive como sorrir também. Distraída, vi meu reflexo na janela do restaurante. Mamãe tinha razão: eu ficava muito melhor quando sorria... Apesar das rugas que surgiam, infames, em minhas bochechas; o sorriso trazia uma luz delicada ao meu olhar, sempre tão duro e inconstante. Um desabafo dos meus ansiosos pensamentos, milhares de pensamentos, a toda hora, por cada coisa, em todo lugar. Como agora: você viria? Por que ainda não estava aqui? Se acontecera alguma coisa, por que ainda não havia me ligado? Quando chegaria? Havia desistido de mim? A verdade era que olhava para fora do restaurante a sua procura e não por causa da neve. Besteirol sentimental, esse Natal! Espiava ansiosamente a entrada do restaurante, os ouvidos abertos para todo e qualquer som de sinos que uma abertura de porta anunciasse. Revirava o celular nas mãos, apertando-o levemente. Foi quando o barulho de talheres caindo na mesa ao lado desviou a minha atenção do mundo interior conturbado a sua espera. Olhei para a origem do som: um garotinho de seus seis, sete anos, havia derrubado a colher que usava para tomar uma sopa de queijo. Estava com os pais: o primeiro, repreendia-o com o olhar, preocupado com a perscrutação alheia de suas vidas; o segundo, envergava-se por debaixo da mesa na tentativa de o auxiliar. Discretamente, tentei olhar para baixo para ver se a ajuda era bem-sucedida. De relance, vi o homem piscar marotamente para o filho, fazendo uma careta engraçada e apontando para cima, indicando  a ele para não se abalar tanto com a cara feia que encontraria. Foi a segunda vez que sorri naquela noite, envolvida com a atmosfera familiar dos meus vizinhos de mesa. Mesmo em meio ao caos de sentimentos que me circundavam. Então, eles voltaram a jantar. E eu decidi escanear o ambiente em que me encontrava. Era um restaurante italiano. Um restaurante italiano decorado para as festividades de fim de ano: festões de um verde profundo eram os cachecóis aconchegantes das pilastras de pedra rústica; guirlandas enfeitadas com fitas vermelhas substituíam os quadros de cantores de ópera famosos; pisca-piscas foram colocados estrategicamente para parecerem vagalumes descansando no meio do salão; um frondoso pinheiro majestosamente atraía os olhares daqueles forasteiros que entravam no restaurante e logo davam de cara com ele. Os funcionários usavam aventais e domas com detalhes natalinos: bordados em verde e vermelho, maquiagens com tons de dourado e muito, muito glitter para todos os lados. Em vez das tradicionais músicas italianas, os alto-falantes gritavam versões pop de Jingle Bells. O cheiro de canela e assados poderiam ter sido pulverizados no ar de tão presentes. Mas, o que não estava presente nessa atmosfera inebriantemente encantadora - e enjoativa - era você. Já se passava meia hora do nosso horário combinado. Pergunto-me quanto tempo você me esperaria se estivéssemos em posições invertidas: dez minutos? Duas horas? Estava sendo exigente demais? Estava negligenciando a mim mesma? O garçom bonitinho me olhou aflito. Estaria ele preocupado comigo? Mostrava a sua piedade por uma mulher bem-vestida, que tomava a sua terceira dose de vinho, enquanto tragava com os olhos o estacionamento? Queria o meu número de telefone? Ou queria que eu pedisse algo substancial para que pudesse garantir a sua gorjeta natalina? 20h45. A família na mesa ao lado se levantou para ir embora. O menininho passou a manga do suéter listrado pela boca melecada de mousse de chocolate. Não pude conter um suspiro. Senti a minha garganta queimar, controlando as lágrimas que lhe subiam torrencialmente. Pobre barreira de contenção... Inutilmente, se esforçou. Porém, não conseguiu evitar que as lágrimas irrompessem por meus olhos vazios que já não mantinham o brilho esperançoso de antes. Não queria estragar a maquiagem que reproduzi tão fielmente às inspirações do Pinterest que salvara por tantos dias. Estraguei. A minha mão se pintou de vermelho, preto, dourado... Não queria amassar o vestido que comprara apenas para aquele dia, o decote quadrado, o tule era uma rede de strass diminutos. Amassei, amassei com as minhas mãos nervosas que torciam o tecido em espirais. E, principalmente, não queria pensar mal de você. Pensei; vislumbrei você chorando, encolhido, enquanto eu lhe dizia impropérios vulgares, jurando não te amar, jurando que te abandonaria, jurando que você não estava à altura da mulher que eu era. O garçom bonitinho percebeu minha consternação e discretamente veio até a mim. Perguntou se eu estava bem, se eu queria que ele me emprestasse seu telefone para ligar para alguém. Olhando em seus olhos azuis, recusei. Ele disse que buscaria uma água com açúcar e desapareceu na movimentação marítima de bandejas e pessoas. Derrotada e envergonhada, decidi me afundar na visão da janela; assim, se eu não olhasse para ninguém ao redor, a minha mente sentiria que eu era invisível, transparente. A rua já estava completamente coberta pela neve fofa. Os transeuntes não se arriscavam mais a perambular sem rumo. O poste de luz, imperativo, esparramava uma luz alaranjada por tudo, palco para os efeméridos flocos de neve que dançavam no palco vazio entre o céu e o chão. Foi quando, repentinamente, Deus Ex Machina, você surgiu. Levantei-me tão rapidamente que não vi o garçom se aproximar e derrubei toda a água que me trazia em seu avental verde Grinch. Deixei na mesa o meu celular, a minha bolsa, a meia taça de vinho espanhol, a minha dignidade. Abri a porta com força, tropecei nos degraus, procurei estabilidade na chuva congelada. Do outro lado da calçada, você sorria, segurando algo atrás das costas. O cachecol azul tremulava ao redor do pescoço. Me disse algo, não entendi. Era o seu pedido de desculpas? Segurou o meu rosto suavemente, enrolou a minha franja na ponta dos dedos, tudo o que eu podia sentir era o cheiro amadeirado de seu perfume sazonal. Então, segurou algo em cima da minha cabeça: era um ramo de visco. Olhei para você, intrigada. Você sorriu novamente, curioso, com... Medo? Sim, detectava a minha velha companheira também em seu olhar: a ansiedade abraçava-lhe, sussurrando dúvidas em seus ouvidos sempre tão destemidos, sempre tão companheiros. Quando olhei para o movimento em sua mão direita, notei que ela também tremia levemente enquanto segurava um objeto circular. Em meio à neve, às portas do Natal, você me pediu em casamento. E eu aceitei.
Share
Tweet
Pin
Share
1 comentários
Newer Posts
Older Posts

Sobre Mim

profile

Bonjour, meu nome é Bruna. Sou uma ratinha de biblioteca, adoro fotografar a natureza, andar por ruas desconhecidas e escrever tudo o que me vem a cabeça. Obrigada por visitar o meu jardim. Abra seus olhos e amplie sua imaginação. Talvez você precise bastante por aqui.

Quer se comunicar comigo? bubslovegood@gmail.com

Marcadores

  • Contos particulares (51)
  • Em minha gaveta (41)
  • Diário da Ratinha (40)
  • Resenhas (38)
  • Comemorações (27)
  • Sunday Love (17)
  • Souris em vídeos (11)
  • Toc Toc (11)
  • Passinhos (9)
  • Radinho (9)
  • Entrevistas (8)
  • Inspirações (8)

Posts recentes

Capítulos

  • ▼  2022 (7)
    • ▼  dezembro 2022 (2)
      • advento, n.2
      • advento, n.1
    • ►  novembro 2022 (1)
    • ►  outubro 2022 (1)
    • ►  março 2022 (2)
    • ►  fevereiro 2022 (1)
  • ►  2021 (18)
    • ►  novembro 2021 (1)
    • ►  outubro 2021 (3)
    • ►  setembro 2021 (1)
    • ►  agosto 2021 (1)
    • ►  julho 2021 (2)
    • ►  junho 2021 (2)
    • ►  maio 2021 (3)
    • ►  abril 2021 (2)
    • ►  março 2021 (2)
    • ►  fevereiro 2021 (1)
  • ►  2020 (66)
    • ►  setembro 2020 (7)
    • ►  agosto 2020 (3)
    • ►  julho 2020 (10)
    • ►  junho 2020 (11)
    • ►  maio 2020 (6)
    • ►  abril 2020 (8)
    • ►  março 2020 (10)
    • ►  fevereiro 2020 (6)
    • ►  janeiro 2020 (5)
  • ►  2019 (72)
    • ►  dezembro 2019 (5)
    • ►  novembro 2019 (1)
    • ►  outubro 2019 (13)
    • ►  setembro 2019 (9)
    • ►  agosto 2019 (2)
    • ►  julho 2019 (2)
    • ►  junho 2019 (3)
    • ►  maio 2019 (7)
    • ►  abril 2019 (8)
    • ►  março 2019 (9)
    • ►  fevereiro 2019 (7)
    • ►  janeiro 2019 (6)
  • ►  2018 (54)
    • ►  dezembro 2018 (6)
    • ►  novembro 2018 (2)
    • ►  outubro 2018 (5)
    • ►  setembro 2018 (7)
    • ►  agosto 2018 (1)
    • ►  julho 2018 (8)
    • ►  junho 2018 (5)
    • ►  maio 2018 (3)
    • ►  abril 2018 (3)
    • ►  março 2018 (5)
    • ►  fevereiro 2018 (6)
    • ►  janeiro 2018 (3)
  • ►  2017 (47)
    • ►  dezembro 2017 (4)
    • ►  outubro 2017 (3)
    • ►  setembro 2017 (2)
    • ►  agosto 2017 (3)
    • ►  julho 2017 (3)
    • ►  junho 2017 (3)
    • ►  maio 2017 (3)
    • ►  abril 2017 (6)
    • ►  março 2017 (5)
    • ►  fevereiro 2017 (8)
    • ►  janeiro 2017 (7)

Disclaimer

A ilustração do cabeçalho deste blog pertence à ilustradora Penny Black e foi usada para fins puramente estéticos.
Facebook Instagram Youtube

Programado por Maria Eduarda Nogueira. Base do tema por ThemeXpose