Perdida na floresta, eu encontrei a magia
Senti-me perdida em um labirinto. Verde e escuro, os pontos de luz ficavam muito longes na imensidão do alto. Abaixo de mim, galhos secos estalavam e besouros monstruosos corriam de um lado para o outro, sempre com pressa de chegar em um esconderijo novo, ignorando que tudo ao redor já formava um esconderijo gigantesco e intransponível.
As árvores seculares eram dúbias em sua funcionalidade para mim: eram elas pontos de apoio e aconchego ou a causa da sensação de aprisionamento que eu sentia naquele lugar? Seus galhos eram tão altos que eu não conseguia escalá-los e as pedras que descansavam no solo não me permitiam ver nada além de um quilômetro de distância. Eu realmente estava perdida em uma massa verde e escura de floresta.
Os meus sentidos aguçaram-se de imediato quando um som estranho fez-se ouvir próximo de onde eu estava. O som vinha detrás de um arbusto de morangos silvestres e ecoava na pequena clareira onde eu permanecia de pé. Era um som chiado e estridente, parecido com o barulho de estática que a televisão faz quando está sem sinal. O som era pavoroso, devo admitir. Lembrava-me das cenas de filme de terror que eu costumava assistir com meus pais quando era pequena. Mas, qual era a causa daquele som?
Aproximei-me do arbusto para tentar investigar, apesar de minhas pernas não quererem fazer o mesmo em um primeiro momento. Cada passo que eu dava fazia pular o meu coração. Tentei afastar os galhos do arbusto, sem que eu o estragasse, e foi aí que eu vi o que causava aquele som estridente e assustador: um ser diminuto tremia de medo e os guizos costurados em sua roupinha balançavam com seu tremor.
Eu nunca soube da existência de seres diminutos até entrar naquela floresta e me perder nela. Para mim, fadas, duendes e qualquer coisa assim eram frutos da imaginação de escritores em busca de um best-seller para pagar suas contas. Mas, quando eu vi aquele serzinho medroso na minha frente, pouco maior do que seis centímetros, toda a razão que tomava minha imaginação se desfez como bolhas de sabão. Será que minha mente começara a criar coisas por causa do meu encapsulamento naquela floresta? Estava eu com tanta sede que meu cérebro já ficara doente?
Os meus questionamentos foram todos respondidos quando aquele ser pequenino começou a falar. Isso porque eu tenho convicção de que minha mente nunca conseguiria inventar um diálogo assim. Aquele ser diminuto era tão real quanto as margaridas que pipocavam ao meu lado, tão real quanto a brisa que secava meu suor frio, tão real quanto minhas mãos tremendo e meu coração super acelerado, que dava sinais de parar a qualquer instante. Ele parara de tremer de medo quando percebeu que eu não era perigosa para ele. Do jeito que ele me olhou naquele dia, tenho certeza de que ele achava que eu era uma potencial melhor amiga.
"Olá, senhorita", ele me disse com olhos brilhantes e um sorriso travesso. "Está perdida? Posso ajudá-la?".
"O que você é?", perguntei atônita. Confesso que fui bem rude, mas, entendam, eu estava embasbacada.
"Willie. Meu nome é Willie e sou um homem-pardal a seu dispor". Ele ergueu para mim sua mão minúscula para que eu pudesse apertar.
"Homem-pardal?", sim, eu me sentia idiota fazendo perguntas como essa.
"É, sabe? O masculino de fada, eu sou uma fada-homem para vocês humanos. E percebi que a senhorita está perdida nessa imensidão multicolorida e aconchegante da floresta. Estou certo disso, certo? Posso te ajudar!". Ele sorria e torcia o chapéu que vestia em suas mãos pequenas e rechonchudas.
"Então, está bem. Por favor, Willie, como eu saio dessa floresta? Estou tentando achar o caminho de volta há horas, mas sempre perco as marcas que faço nas árvores pelas quais já passei. Você mora aqui, certo? Qual é o caminho até a entrada da trilha do Parque Municipal?", perguntei.
Willie piscou duas vezes. Ele parecia pensar. Depois de alguns minutos, suas bochechas ficaram vermelhas e ele olhou para mim com os olhos cheios de água.
"Senhorita, eu não sei muito bem como ir para a entrada desse parque. Eu não moro aqui, estava apenas visitando a Terra para ajudar na chegada da Primavera. Acabei ficando perdido, distanciei-me de meus amigos e estava pronto para desatar a chorar quando a senhorita me encontrou. Desculpe-me, não fique brava comigo, por favor".
Eu não conseguia ficar brava com ele. Por que ficaria afinal? Estava perdida mesmo, a esperança falsa que Willie me trouxera serviu mais para eu me encorajar a seguir em frente... Se ele não sabia como eu poderia sair da floresta, pelo menos eu conseguiria ajudá-lo a encontrar seus amigos. Para alguma coisa deveria servir eu ser uma humana alta, não é?
"Tudo bem. Eu não estou brava com você. Vou te ajudar a encontrar seus amigos, tá?", disse. Peguei-o na mão e fui à procura de mais homens-pardais e fadas perdidos pela floresta.
Pelo que Willie me contou, seus outros amigos eram mais experientes do que ela no trabalho na Terra. Eles, sim, é que tinham habilidades para transformar as estações aqui; Willie era só um homem-pardal que ajudava as crianças a acreditarem nas fadas, ou seja, visitava mais as cidades do que as florestas e não conseguia, assim como eu, diferenciar uma árvore da outra. Por isso se perdera. Emaranhara-se, na busca, naquele arbusto de morango em que eu o havia encontrado.
Minha cabeça estava girando com tantas informações caóticas e fantásticas. Quando sua última opção frente à razão é acreditar, você acredita e não discute mais. Naquela hora, minha missão era encontrar outras fadas na floresta-prisão e era isso que eu faria. Meus olhos perscrutavam cada canto daquela floresta em busca de um brilho amarelado. Meus ouvidos, em busca do som chiado e estridente.
Enquanto procurava, Willie me contava as histórias maravilhosas de seu povo. Eram uma sociedade mais bem estruturada do que a humana. As fadas faziam a Terra funcionar, auxiliando a Natureza no que ela precisasse, trazendo o frio, criando os animais, descongelando o solo. Mas, além de trabalhar para o mundo dos humanos, as fadas também tinham funções internas para fazer funcionar sua própria sociedade. Para a minha surpresa, descobri que haviam fadas-padeiras, fadas-costureiras e homens-pardais-sentinelas (a ameaça vinha dos céus - gaviões eram seu principal inimigo).
Contudo, a função que mais me encantara era a do próprio Willie. Descobri que as fadas morriam se não acreditássemos mais nela, por isso, fazer com que as crianças batessem palmas para reanimá-las era a função mais útil e benevolente que uma fada ou homem-pardal poderia ter! Foi pensando nisso que eu ouvi um som incomum, mas, agora, natural para mim: o chiado estridente.
"Ali!", Willie berrou animado. "Meus amigos me procuram ali, veja, senhorita! Conseguimos achá-los! Obrigado pela ajuda, muito obrigado".
Meu coração se esquentou quando eu ouvi suas palavras de gratidão. Willie me puxou, batendo suas delicadas asas, para o grupo preocupado e agitado de fadas e homens-pardais que o procurava. Quando eles viram Willie, começaram a fazer barulhos de sinos e a dar pulos de alegria no ar. Diferente de Willie, eu não conseguia entender o que eles diziam, mas pude sentir todo o carinho e gratidão que eles tinham por mim por ter ajudado Willie a voltar para os seus.
Willie, então, parou em frente a uma fada mais velha e pediu: "Por favor, Andressa, ajude minha amiga senhorita a encontrar a saída para o Parque Municipal. Ela foi tão boa comigo, por favor, ajude-a a voltar para casa também". Andressa, a fada mais velha, olhou para mim e piscou. Então, ela pegou um pouco de um pózinho amarelo e brilhante em sua mão e jogou em cima de mim. Depois disso, senti meu corpo flutuar e meus olhos se embaçarem. A última coisa que vi foi Willie acenando para mim com lágrimas nos olhos.
Estou aqui, sentada em meu quarto, enquanto escrevo isso. Depois daquele dia, nunca mais eu vi Willie ou qualquer outra fada. Mesmo assim, todos os dias, bato palmas e mentalizo que eu acredito nelas para que as fadas continuem a viver por toda a eternidade. Willie me disse que todo ser humano tem uma fada correspondente. Por muito tempo, achei que ela se pareceria comigo, mas foi então que aconteceu um clique em minha mente... Aquele sorriso, aquelas covinhas, a mania de chamar a todos de "senhor" e "senhorita"... Willie! Willie era meu homem-pardal correspondente. Que alegria!
Como eu gostaria de revê-lo... Quem sabe um dia me perco novamente me uma floresta por aí?
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